quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Solução

Engoli tudo de uma vez, como se a vida (ou a morte) fosse uma bebida de gosto amargo e efeito de torpor. E nesse torpor senti descer pela minha garganta, queimando, os meus erros, e por pouco meu medo não me fez vomitar aquela última dose de sentimentos. Pude sentir aos poucos o remédio fazer efeito. Pés e pernas adormecidos, o corpo fraco colou-se ao chão. As mãos, ainda teimosas, insistiam em tocar uma última vez alguma coisa que lembrasse o amor que senti. O coração batia fraco. E o calor que sentira há pouco, se transformou em um calafrio que me percorreu inteira e me fez sentir um grande deserto. Por alguns segundos, o coração acelerou. E pude sentir parar repentinamente. Derramei minha última lágrima. Eis o que sobra de um ser humano. Eis meu testamento.

    “ Deixe meu corpo frio, inerte e vazio. Não deixe nada nele. Arranque tudo que este carregou um dia, pois sua única carga deverá ser ele mesmo. Deixe que a carne se desfaça sob a terra, para alimentar a vida sobre ela. Fazendo o novo florescer, como apodrecimento do velho. Ou deixe que o pó ao qual retornarei repouse na superfície do mar, indo descansar em alguma profundeza escura e silenciosa, ou seguindo a correnteza em direção a algum lugar onde tudo descansa.
    Deixe aos filhos que não tive minhas muitas palavras inúteis. E aos amores que senti, meus sonhos em vão. Deixe aos corações que parti meu coração parado. Deixe meu nome escrito em alguma árvore, meu rosto estampado em algum muro. Entregue a quem me amou alguma foto que me retrate da maneira como este se lembra de mim. Que todos possam perdoar minha covarde coragem de me entregar. Deixe agora que eu faça o que em vida jamais consegui. Calar.

Isabela Moraes
14/08/10

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Passo a Passo de um Coração Partido

  Me despedir de Você Me despir da esperança de ser tua Me despejar em mim Me deitar nua Mas não ao teu lado Você fugiu Você fingiu Você fic...